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CHEFE SARA SOARES


O futuro de Portugal também se escreve no feminino. 
Sara Soares, ex Penha Longa Resort, apresenta-se determinada. 
Os seus pares adjectivam-na como prática, assertiva e perfeccionista. 
Não se deixa intimidar por se incluir numa área predominantemente masculina. 
Afirma-se ao mais alto nível. 
No seu curriculum vitae somam-se experiências nos melhores restaurantes do mundo. 
Contam-se 31 anos recheados de sucessos e de mestres. A sua mãe figura no topo.


Fotografia: Humberto Mouco
Chefe Sara Soares

Do direito para a pastelaria. Por que razão? 

Não posso dizer que tenha existido uma razão concreta para essa mudança drástica. Simplesmente sempre fui mais feliz a levar doces para os meus colegas de faculdade provarem (e a receber o feedback deles no final) do que propriamente a aprender teorias jurídicas.

Uma grande parte da tua carreira foi passada em hotéis. Escolha ou acaso? 

Todos esses hotéis por onde passei têm óptimos restaurantes. Optei por essa via porque assim conjugo o melhor dos dois mundos: trabalhar com as condições que um hotel oferece (que, regra geral, são melhores a nível de equipamentos, de material e de espaço) e fazer aquilo que mais gosto: criar sobremesas e dar serviço.

Pudim Abade de Priscos de katsuobushi, umeshu e granizado de coentros

Estiveste também no Celler can roca e Azurmendi, ou seja, trabalhaste com a nata da pastelaria espanhola. Qual foi ou quais foram as principais lições destas experiências? 
Em ambos os sítios aprendi a mesma lição, que é muito simples e que vou levar para o resto da minha vida: podemos estar no topo do mundo, mas nunca nos podemos esquecer do caminho que fizemos até lá - humildade é a palavra-chave.


Adjectivas a tua pastelaria favorita como "pura e dura" em que é que isso se traduz? 

Pura e dura no sentido em que acho importante construir e criar a partir de boas bases. É imperativo conhecer os clássicos. Saber fazer uma ganache, um gelado, uma massa de brioche, por exemplo. Noto muito que quem está a começar agora nesta área, mais depressa faz um spongecake do que uma dacquoise e isso é querer correr sem saber andar primeiro. 

Todos os restaurantes por onde passaste foram importantes no teu percurso. Por que razão destacas a herdade do esporão? 

O Esporão foi, é e será sempre uma família para mim. Foi o sítio que mais me marcou profissionalmente por vários motivos: a humanidade de todos os que lá trabalham (posso mesmo dizer que foram os melhores patrões que já tive!); o verdadeiro conceito de farm to table; a aposta (ganha) na sustentabilidade e na sazonalidade; o amor pela terra e pelo produto; o respeito e a valorização dos  produtores locais. 
Para além de tudo isto, o Esporão foi um ponto de viragem na minha carreira - foi onde tive pela primeira vez uma posição de responsabilidade como chefe de partida.

Onde ou em quem te inspiras?

Inspiro-me muito naquilo que leio (seja ou não relacionado com Pastelaria), nos clássicos e sobretudo no meio natural que me rodeia.


Quem admiras? 

Profissionalmente, admiro todos os grandes chefes com quem mais aprendi: Joaquim Sousa, Filipe Manhita, Bruno Rocha (que não é chefe de pastelaria, curiosamente), Francisco Moreira e Francisco Siopa. Há mais, claro!, mas estes são o meu top 5.
Pessoalmente, a pessoa que mais admiro é a minha mãe - é a mulher mais forte que conheço.

Diamantes de earl grey, bergamota e infusão de croissant francês

Após o convite do chefe Francisco Siopa assumiste a chefia dos restaurantes. Como é que geres a responsabilidade? 

Foram dois anos muito intensos, dos quais resultaram mais de 60 sobremesas (!) para os vários outlets do hotel. 
Estarei para sempre grata ao chefe Francisco Siopa e a toda a direcção do Penha Longa pela incrível oportunidade que me foi dada. Aprendi tanto, mas tanto! Especialmente no que toca à gestão de pessoas, uma vez que a equipa é composta por 17 talentosos pasteleiros de quem me orgulho imenso. 

Passados 10 anos de carreira - criativamente - sentes algum tipo de saturação? 

Sinto que preciso de fazer algo diferente durante algum tempo para "descansar um bocadinho a cabeça".

Concordas que há um empobrecimento da pastelaria nacional, entenda-se pastelaria de rua,  a comum?

Há estagnação e há falta de qualidade, na maioria dos  casos (recorre-se muito a mix´s e a produtos congelados). Se está mais pobre, efectivamente não sei, mas não é essa a pastelaria que vejo como representante da cultura portuguesa.

Mil folhas de framboesa, limão e sabugueiro

Retirar açúcar a um pudim Abade de Priscos. Pecado ou evolução?

Pecado capital!
No entanto, podemos usar katsuobushi em vez de toucinho e umeshu no lugar do vinho do Porto. Isso é perfeitamente aceitável.


Pasteleiros pouco valorizados. Mito urbano ou uma realidade? 

Uma triste realidade.

Como vês a pastelaria hoje, decorridos 10 anos?

Vejo uma evolução. Há vontade de fazer mais e melhor e isso é muito importante.
Claramente que ainda estamos muito longe de ter o reconhecimento que merecemos, mas estamos a trabalhar para isso. Um ótimo exemplo desse esforço, para mostrar o que de melhor se faz na Pastelaria em Portugal, foi Pastry Blue Box by Makro presente no congresso nacional de cozinheiros, uma iniciativa do Carlos Fernandes em conjunto com a Andreia Moutinho e com o importantíssimo apoio do Paulo Amado e das Edições do Gosto.
Agora é dar o próximo passo. E para isso, porque não seguir o exemplo de nuestros hermanos e fazer algo como a MIP (Madrid International Pastry)? 
Adorava poder fazer parte de algo assim.

Para ti uma excelente sobremesa tem que ter... 

Equilíbrio de sabores, texturas e temperaturas. Ser doce, ácida e salgada - sem nunca deixar de ser claramente uma sobremesa. Fazer pele de galinha e consolar a alma ao mesmo tempo. Fácil, não?

E, como não poderia deixar de ser, a pergunta da praxe: O que ambicionas para o teu futuro? 

Ambiciono ser feliz a fazer o que mais amo.



Milho -
sorbet de milho verde,
gelado de pipocas,
creme de milho nixtamalizado,
pó de pipocas e milho frito.





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