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TRAZER HUMANIDADE

Originalmente publicado no Etaste Escrever sobre humanidade quando temos dos melhores hotéis, das melhores praias, dos melhores sóis? Sim! Insisto no detalhe humano. Não compactuo com a ideia antropozoomorfista tão característica e representativa do clássico pensamento hoteleiro português. Palavra tão extensa e complexa quanto as suas raízes. Sinto, como todos vocês, este conjunto de irónicas antíteses, digamos, contradições bastante objectivas do que se parece ao que efectivamente é. Ser verdadeiro por imposição instintiva é muito diferente de sê-lo com medo das consequências, quero dizer, a necessidade da abordagem, por respeito à realidade, é o centro do meu dever enquanto parte de um todo que é tão meu quanto vosso. A palavra humanidade está para a hotelaria e restauração como Satanás para a Igreja. Por quê? Porque sendo uma das áreas mais distantes do que podemos considerar razoavelmente ético e lógico, no que à gestão de recursos humanos diz respeito, será bem-vindo

A MEDIATIZAÇÃO DESMEDIDA

Originalmente publicado no etaste.pt VER AQUI   Um cozinheiro deve, na melhor das hipóteses, ser julgado apenas pelo seu trabalho. São menos as vezes em que a ilusão do que parece se mistura com a ciência do que realmente é. Espalhar a própria imagem é um exercício de cortejo simplista. A forma mais rápida de se conhecer o verdadeiro profissional, não o que é vendido, o verdadeiro, é pelo lado tangível da sua cozinha/obra. Aí está tudo o que é objetivamente necessário conhecer. Não esconde qualquer imperfeição, por muito que haja intenção. O exibicionismo, quero dizer, o exibicionismo barato serve, na maioria das vezes, para esconder lacunas profundas. Ludibriar. Há os que são e há os que parecem ser. Um, sustentável, o outro indefensável, respectivamente. Os fins são coordenados pelas paixões às quais a razão sempre se subordina. O valor, digo, a utilidade subjacente neste tipo de instrumentação é, de certa forma, dispensável, pois a aptidão deriva da vontade e esta está

ANTI-PROFISSIONALIZAÇÃO

Fotografia : Humberto Mouco  Vi com muita atenção o programa “Prós e Contras” transmitido no passado dia 17 de dezembro, sob o tema “Cozido com todos” no qual participou um ilustre painel constituído por: José Avillez, Paulo Amado, Olga Cavaleiro, José Bento dos Santos, Vincent Farges e Alexandra Prado Coelho. Painel este, muito mal aproveitado pela moderadora que se perdeu claramente entre “nabos e grelos”. A frase “Todos querem ser chefes” continua na moda. O público delira: (aplauso) “URRA!” (aplauso) “URRA!”, “ASSIM É QUE É FALAR!”, “GRANDE!”, “GRANDE!” (aplauso mais prolongado). Mas, como para falar qualquer um pode, basta ter boca, é premente agarrarmos o touro pelos cornos, i. e., analisarmos com pragmatismo, intentarmos tocar a raiz. O que definimos como gastronomia é um conceito muito mais abrangente que o punhado de restaurantes que conhecemos, trabalhamos ou frequentamos. Importa trazer ao debate os 85.000 (valores aproximados, de acordo com o INE) estabelec

PAI NOSSO QUE ESTAIS NO CÉU, SANTIFICADO SEJA O VOSSO..

Digamos que, em pleno séc. XXI, o tema «Motivação» continua a ser tabu. Para espanto ou desagrado do leitor este continua a ser um debate que estremece os grandes velhos do Restelo, de sorriso amarelo.  “Gosto de falar no plural, eu e a minha equipa“ ou "não me posso esquecer da minha equipa, eles são o mais importante para mim" estes   continuam a ser dos jargões mais utilizados para agrado das revistas cor-de-rosa e consequente vénia dos transeuntes menos informados, cá do burgo.  A ironia está lá sempre , disfarçada por entre algumas patacoadas nervosas. Por cá, do outro lado da civilização menos representada, embora mais representativa, existe um certo desprezo para com essas lindas frases (lindas mesmo!) , porque na prática, sabemos que se resume (na maior parte das vezes) a um mero SLOGAN político. Nos casos mais sensíveis uma lágrima pode cair do canto do olho, mas depois passa.  Mas afinal o que é isso de motivação ? Pagar uma bifana e uma palmadinha na

CRIATIVIDADE (IN)CONSCIENTE

Francesc Guillamet/Phaidon Press Publicado originalmente no ETASTE Surge de forma consciente ou inconsciente. A parte consciente , a que controlamos, é gerida pelo lado mais racional, normalmente fechada sobre si. É o resultado do natural processo cognitivo. Esta pode ser afetada por fatores externos e até próprio estado de espírito . A parte inconsciente , a que não dominamos e nem sequer conhecemos verdadeiramente, é a responsável pelo nosso lado mais infantil e primitivo de toda a associação de ideias. Juntas são nada mais nada menos que sistemas organizados, quase automáticos na forma e no lugar. Servem-nos para agilizar o processo que se quer tão lento quanto possível. Lentidão é a palavra-chave. A rapidez perturba quase sempre a tomada de decisões. Por isso não é bem-vinda, apenas na execução. A lentidão é por isso benéfica, pois resulta frequentemente, em vários processos difusos que se acumulam na desordem. A confusão ou mudança de perspetiva é obrigatória. A par

SOU FOODIE. E AGORA?

Publicado originalmente no ETASTE   Ou na forma mais completa: Foodie, Blogger, Instagrammer- FBI E agora? Agora acaba de se inscrever - ainda que de uma forma substancialmente abstrata- num clube privado, cheio de estilo, moderno e in . Já comprou o fato? E a lanterna para o telemóvel? E o talher especial? aquele dourado! Não se esqueça da caneta cara e de um bloco A5 para toda a gente perceber que irá tirar apontamentos. Os óculos são imprescindíveis, mesmo que não precise, dá sempre um certo ar intelectual de cagança exigente. Escreva uma lista de chefes e restaurantes, leve-a no bolso, quando entrar pergunte se o chefe está, tratando-o pelo primeiro nome, como se fossem amigos de infância, se não estiver convém manifestar revolta e desdém. Coloque o termómetro infravermelho em cima da mesa para verificar a temperatura dos vinhos e vá apontando, mesmo não percebendo nada, espalha o seu charme. Durante o jantar mantenha a aparência, não se coiba de explanar os seus conh

APERTAR O AVENTAL

Originalmente publicado no  ETASTE Mais certos ou menos errados, mais apertados ou menos largos, são sempre nós, com muitos significados! Há centenas de anos que o avental marca uma revolução decisiva e duradoura como a teimosia higiénica de quem a impôs. Foi a inovação de ontem, é o habitual hoje, será a renovação do amanhã, simboliza o trabalho. O avental representa a estrutura complexa que esbarra na simplória vontade de bem parecer, cuja função, vai muito além da barreira às nódoas, do trabalho bruto e por vezes sujo. Um dos gestos mais simples e bonitos que ainda perdura na minha memória, aconteceu no primeiro dia da minha vida profissional e advém precisamente da observação do meu primeiro chefe, que à entrada da cozinha apertava o avental branco e impecavelmente limpo, contra o peito, de mãos lestas a abraçar o quadril. Aos meus olhos aquela rapidez gestual conquistada pela repetição exata ao longo dos 30 anos de carreira, parecia-me um movimento tão inato como a vida

MANIFESTO ANTI-EGO

Foto de : Paulo Costa Esta foi a minha primeira crónica para o renovado portal etaste.pt VER AQUI  . Manifesto anti-ego É puto, mas já é o melhor cozinheiro da sua geração! Trata Escoffier por tu, para ele não há complicações, sabe quase tudo, na carreira dele contam-se 12 meses de experiência. Afinal haverá tempo mínimo para alguém acumular tamanha sabedoria? Eu acho que não, acho até bastante provável que ele saiba mesmo quase tudo! O que não sabe, faz parecer que sabe. Seja que tema for, dominará sempre melhor do que eu e o leitor. A cada dia que passa diz aprender inúmeras técnicas – ou diz que aprende – nas orgias secretas aos livros, que diz ter. Nasceu mesmo para isto, diria melhor, é um génio que ninguém descobriu… ainda! Sim, tenho a felicidade de conhecer génios deste tipo! Que sorte que eu tenho neste desprazer tão inútil quando conheço pela primeira vez uma destas espécies por aí espalhadas, em número maior do que julgava existir, todavia faz parte. Identific

ESTÓRIAS DO RESTAURANTE DESORIENTADO

Entro e saio em vários restaurantes todas as semanas. Levo sempre a mesma expetativa - nem sempre justa, mas minha, só minha – que me vou sentar, ser bem atendido e comer bem. E a verdade é que saio sempre satisfeito: satisfeito por ter mais um restaurante na lista negra ou satisfeito por incluir mais um restaurante na minha rotina gastronómica. Ando interessado por adivinhação, não é ocultismo, eu chamo - lhe de uma forma mais tosca : - "Bate agora com a cabeça, depois acertas" .  Hoje basta-me um olhar rápido, nem sempre ligeiro, pela carta de um restaurante para saber o que lá dentro vou encontrar. Tenho atenção aos detalhes como traduções, disposição dos frios e quentes, preços e a qualidade gráfica e depois levo o estômago queixoso para uma mesa qualquer . Naquelas conversas de amigos, pelas noites quentes dos meses de Verão, surgiu um tema, também ele quente. A discussão prendeu-se ao facto da legitimidade de vários empresários. Seria necessário ou não

VOCÊ É DA ÉPOCA?

Caro Leitor, Actualmente, há uma maior delicadeza para a sazonalidade do produto, estaria a mentir se não o referisse. Existe, porém, uma grande demagogia no tratamento do assunto.  Quanto aos restaurantes em que os cozinheiros vão à pesca de manhã para cozinhar os peixes de seguida, acho realmente engraçado,   pelo menos  enquanto  o sonho durar. Menos graça deve achar o chefe Thomas Keller, pois ele próprio, cumpre o ciclo e produz efectivamente. O leitor pode, com todo o direito, achar este movimento ecologista e moderno, mas se lhe disser que, pese embora noutro formato, já constava no  Regula Benedicti  do séc. VI escrito por Bento de Núrsia, cuja regra ordenava que se comesse exclusivamente o que se produzia, o caso muda, principalmente quando chegamos à conclusão de que estamos continuadamente prisioneiros dos editoriais mais vendidos. A exacerbada cagança das velhas novidades vendidas como regenerativas, aproveitadas pelos populistas, incansavelmente desejosos de um

ARTE RACIONAL

Onde há seres humanos existem problemas, por definição. Para todas as situações há um acto, uma consequência e uma solução. Em cada um dos estádios, digamos, podemos tomar inúmeras atitudes que, não obstante dependerem das circunstâncias, devem ser sempre alvo de análise atempada de forma a não corrermos o risco de julgamentos contraproducentes. Um dia, um colega perguntou-me porque razão lia um livro de psicologia. Respondi, dizendo apenas, que cozinhar e todo o seu enredo trata-se 50% de cozinha e 50% de psicologia ou emoção, como me disse outro colega, o Ruben do restaurante O Paparico. Do estudo técnico não abdico, mas se pensarmos que a psicologia está presente em quase tudo no dia a dia, não é assim tão irrelevante. Christian Schloe Philip Johnson-Laird, conhecido professor da Universidade de Princeton, disse a propósito: - “…os seres humanos são racionais, em princípio, mas erram na prática, ou seja, os seres humanos têm a competência para serem racionais, mas

FANTASIAS DE UMA COZINHA MAIS FELIZ - RENÉ REDZEPI

Decidi publicar por considerar uma visão pertinente,escrita por uma das figuras mais relevantes do panorama internacional da gastronomia. Escrito por :René Redzepi ( chefe e proprietário do restaurante Noma Ver aqui )  Eu comecei a cozinhar no tempo em que era comum ver os meus colegas a levarem um tabefe por cometerem pequenos erros na cozinha e ver pratos a voarem em direção aos cozinheiros que estavam a fazer o seu trabalho de modo muito lento. Não me era nada estranho ser chamado de parvalhão inútil ou muito pior.. Era bastante comum o facto de eu querer pegar numa panela e descobrir que alguém tinha metido a pega no fogo e voltado a coloca-la no meu posto de trabalho só para me chatear. Foto de : ver aqui Eu já vi chefs (da minha equipa e da dos outros) a usar o bullying (ameaças, perseguição) e a humilhação para conseguir obter resultados dos seus cozinheiros. Pensava para mim: Porque é que é necessário? Eu nunca serei assim. Mas depois tornei-me

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