-Esta é a cozinha de um dos edifícios mais importantes da História de Portugal.
-A dieta quinhentista.
-Os rituais da refeição do Rei.
Estes são alguns dos temas tratados neste publicação.
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O Paço Ducal começou a ser construído no ano de 1501 pelo quarto Duque de Bragança. Desde então foi sofrendo variadas obras de remodelação.
No séc.XVII, com a ascensão da Casa de Bragança ao trono, em 1640, este Paço torna-se residência permanente da família Real.
A partir do ano de 1910, com a implementação da República, o Paço é encerrado, reabrindo por vontade expressa de D.Manuel II ao público, 30 anos depois.
No séc. XVII saiu desta cozinha, por exemplo, o banquete de casamento de D.João IV com D.Luísa de Gusmão, que António de Oliveira de Cadornega nos descreve na sua obra "Descrição de Vila Viçosa".
A dieta "Nobre" era composta essencialmente por carne, muita carne, pouco peixe e poucos legumes.
Em 1524, na despensa da corte, estão registadas três toneladas de carne de vaca e meia tonelada de carne de porco.
O peixe é mais raro, era consumido sobretudo seco,fumado ou salgado.
Outro produtos como açúcar, tomate ou chocolate provenientes dos novos mundos iam alterando os hábitos alimentares da Corte.
Nesta época a cozinha não tinha um chefe de cozinha, mas sim um cozinheiro-mor de seu nome Pontes, era ele quem se encarregava de toda a organização das tarefas, neste Paço.
A organização ainda estava longe dos actuais modelos, estes iniciados por Escoffier uns séculos mais tarde.
O chefe de pastelaria era designado por pasteleiro-mor, de seu nome Gaspar Girão, que seria o então responsável pela secção onde eram produzidos todos os doces.
Cozinha de preparação |
Cozinha de preparação |
Cozinha dos assados |
Cozinha dos assados |
Cozinha dos fogões |
Cozinha dos fogões |
As refeições acompanhavam o ritmo do sol. O almoço era servido às 11horas. Mais tarde serviam o jantar e depois a ceia. A última refeição acontecia por volta das 19H.
Nesta altura, por muito incrível que possa parecer, tanto o Rei como os príncipes faziam as refeições nas câmaras Reais , onde só participavam os familiares mais importantes ou visitas, todas do sexo masculino.
Os pratos eram transportados pelos moços da câmara, que passavam por duas fileiras de soldados da guarda do Rei.
O trinchante era reponsável por fazer chegar ao Rei uma salva de prata com a mão esquerda para o Rei lavar as suas mãos.
Os resposteiros da copa eram encarregues de colocar a mesa, colocavam um saleiro, o pão e o manteeiro. A mesa era benzida, antes do Rei chegar, pelo capelão-mor.
Um moço da câmara, por fim, levava ao Rei uma toalha numa bandeja para que sua Majestade pudesse limpar as mãos. Terminava a refeição com doces. A acompanhar as refeições do Rei estavam, por vezes, vários moços fidalgos que assistiam ajoelhados.
A Rainha fazia as refeições sozinha ou acompanhada pelas damas de companhia, noutra câmara.
Só mais tarde, D.Pedro introduz o conceito de comidas públicas do Rei, que tinham lugar nos dias festivos,casamentos,baptizados. Para isso utilizavam uma mesa, numa sala de jantar , conceito hoje muito comum mas nesta época era uma novidade.
A partir do séc.XVIII é que a sala de jantar começa a ser vista como espaço exclusivo das refeições.
Uma refeição habitual no paço era composta, nesta altura, por muita carne, produto este inacessível às classes sociais mais baixas: perú, porco, galinha,pombos caseiros, carneiro e vaca.
Para que isto tudo fosse possível a familia estava rodeada de um séquito de cerca de 300 pessoas.
Das primitivas cozinhas já nada resta, o que vemos hoje é resultado de remodelações executadas por D.João V.
Esta cozinha é composta por três secções: cozinha de preparação, cozinha dos assados e cozinha dos fogões. Em exibição está um total de 534 peças de cobre e 32 de ferro.
Sala de Jantar |
Tecto da Sala de Jantar |
Deixo-vos um registo dessa altura, do caderno de cozinha da Infanta D.Maria (1521-1577) de uma receita de biscoutos, que provavelmente foram servidos neste Paço, para que os mais audazes possam replicar em casa:
Tomem a farinha de trigo branco peneirada, um alqueire de pó,e,para um alqueire dous arratéis de açucar bem peneirado, e façam na farinha uma presa e deitem-lhe o açúcar e um púcaro de água quente. E junto desta presa façam outra e deitem-lhe um quartilho de água-de-flor-de-laranja e meio de vinho branco e uma colher muito pequena de manteiga. E se não quiser que levem manteiga, deitem-lhe a este alqueire uma medida de azeite muito fino. Então misturem a farinha toda e sovem-na muito bem até que se ajunte àquela massa. E para se lavrar bem a massa há-de ser mais sobre o mole que sobre o duro.
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Bibliografia:
Fotografia: evora360.portugal.com
Buescu, Ana Isabel, À mesa do Rei: cultura alimentar e consumo no séc. XVI; Imprensa da Universidade de Coimbra, 2011
Fernandes, Isabel Maria, Alimentos e alimentação no Portugal quinhentista, 2002
Livro de cozinha da Infanta D.Maria, Imprensa Nacional- Casa da Moeda, 1987
Pereira Maques, Ana, Mesa Real, esfera dos livros,2012
Pereira Maques, Ana, Mesa Real, esfera dos livros,2012
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