Avançar para o conteúdo principal

ESTÓRIAS DO RESTAURANTE DESORIENTADO



Entro e saio em vários restaurantes todas as semanas. Levo sempre a mesma expetativa - nem sempre justa, mas minha, só minha – que me vou sentar, ser bem atendido e comer bem.

E a verdade é que saio sempre satisfeito: satisfeito por ter mais um restaurante na lista negra ou satisfeito por incluir mais um restaurante na minha rotina gastronómica.

Ando interessado por adivinhação, não é ocultismo, eu chamo - lhe de uma forma mais tosca : - "Bate agora com a cabeça, depois acertas" . 
Hoje basta-me um olhar rápido, nem sempre ligeiro, pela carta de um restaurante para saber o que lá dentro vou encontrar. Tenho atenção aos detalhes como traduções, disposição dos frios e quentes, preços e a qualidade gráfica e depois levo o estômago queixoso para uma mesa qualquer .

Naquelas conversas de amigos, pelas noites quentes dos meses de Verão, surgiu um tema, também ele quente. A discussão prendeu-se ao facto da legitimidade de vários empresários. Seria necessário ou não uma licença, de habilitações, se quiser, para se poder construir um restaurante? Ao invés do típico pensamento frívolo das pessoas que vão dizendo nas mesas das esplanadas :“- Eu vou investir num restaurante porque dá muito dinheiro! “ ou então : “- comes e bebes dá sempre!”
Na altura hesitei, mas à medida que o tempo passa, concordo com esta “legalização”.
Não! Prezado leitor, não é burocratizar. É, talvez, ajustar o que é desajustado por definição em consequência do inócuo controlo profissional e devido.


O que é desajustado? Pergunta você e muito bem. Eu escrevo:



- Pagar 10€ por 3 pedaços de carne com 3 batatas que esperavam por mim aconchegadas pela banha de porco, aquecidos no micro-ondas ranhoso e solitário, no canto mais escuro da cozinha, onde, de vez em quando, a solidão é substituída pela visita de um artrópode.



- Sentar-me e esperar tanto tempo para ser atendido que, em estado de sonho, achava muito plausível estar numa repartição de finança 

- Confundir a carta com um documento do Séc. XVIII da torre do tombo. 

- Ouvir a televisão com um volume exageradamente alto que quase não consigo ouvir a mastigação divertida do empregado de mesa que vai escrevendo com a mão o meu pedido e com a boca vai desenhando uma coisa qualquer na parede atrás de mim

- Aproximarem-se de mim no final da refeição, desta vez com um hálito trident e perguntarem-me se desejo uma sobremesazinha, um cafezinho ou a continha. Como sempre, solicito apenas o terminalzinho para exercer o meu dever de pagar a contazinha com o meu cartãozinho.



Desajustado é também o excesso de sítios a venderem “comida” e poucos sítios a funcionarem como restaurante.

Senhores restaurateurs ,
É necessário fazer contas! É necessário perceber do negócio! Se não sabe, pague a quem lhe possa explicar, mas por favor não vendam cheesecake em restaurantes de cozinha portuguesa nem vendam folhadinho de pescada sobre cama (sem lençol) de legumes em restaurantes de cozinha tradicional portuguesa. 

Trabalham pessoas consigo que estão do outro lado do muro incompetente e obtuso da vossa inconsequente teimosia.

Fotografia: Nilton Freitas
Texto: Tiago Lopes

Leitores