Avançar para o conteúdo principal

COCKTAIL DE CAMARÃO

Maria De Fatima Moura



Maria De Fátima Moura formada em Filosofia e em cozinha pela Escola de Hotelaria e Turismo do Estoril. Publicou vários livros na área de gastronomia e foi distinguida internacionalmente.
Em Portugal: O melhor peixe do mundo, o grande livro de Chefs (2008) e Cataplana Experience (2009), Maria De Fátima Moura reúne receitas dos chefs mais conceituados a trabalhar em Portugal,  com notas de história e conselhos sobre como cozinhar.
  A autora , em 2010,foi distinguida pela Academia Internacional de Gastronomia, tendo vencido o "Prix de la Littérature Gastronomique" Com o livro "Cataplana experience". "Em 2013, Portugal, o melhor peixe do mundo, foi o terceiro na sua categoria dos Prémios Goumand.
Escreve também um blog, Conversas à Mesa.




Viagens ao passado: o cocktail de camarão


Tiago- "Curiosamente foi este cocktail o primeiro prato que confeccionei num ambiente profissional, no hotel solverde 5* ,tinha entao 15 anos!

A comida também é de modas. Hoje em dia temos vários exemplos correntes, uns mais felizes que outros. Houve a moda do tété a 62ºC, que felizmente parece estar a passar, a do exagero das flores no prato ou a da omnipresente rúcula.

Há pratos que se comeram exaustivamente durante uma década ou mais, ao longo da qual foram amados e populares, sendo que alguns deles caíram completamente no esquecimento enquanto outros permaneceram bem vivos ou foram ressuscitados no formato vintage. Os que sobreviveram foram, em geral, os mais simples.
Nos anos 60, uma das minhas paixões alimentares de adolescente foi um desses pratos icónicos recentemente recuperados: o cocktail de camarão, quase tão por mim amado quanto os crepes Suzette.


Foi prato emblemático em quase toda a Europa, embora a sua origem seja estado-unidense, mais precisamente Lasveguiana, onde era feito com um molho vermelho muito escuro apicantado. Diz-se que o uso do copo de pé alto poderá estar ligado aos anos da lei seca, por emular um cocktail.




Em Lisboa, comia-se nos restaurantes mais refinados (no Gambrinus ainda hoje se serve o cocktail de gambas), mas sobretudo em hotéis, como o Ritz ou o Palácio do Estoril. No antigo Avis, Mestre João Ribeiro criou um cocktail semelhante, mas com miolo de amêijoa no lugar dos camarões. Aliás, esta entrada era tão simples que havia a tendência para lhe introduzir pequenas alterações a gosto de cada um, sobretudo na secção do molho.
Como é possível que uma cama de alface migada com escassos camarões e molho cor-de-rosa pudessem ter feito as delícias da década de 60? E mais ainda, como é possível que se assista a um revival desta entrada? Símbolo de uma refeição requintada à mesa da burguesia lisboeta, este prato tinha carisma suficiente para lhe emprestar um ambiente de felicidade. O seu acompanhamento mais requintado seria um gin tónico ou um dry Martini (“stirred not shaken”), quiçá um vinho branco. Hoje teria recebido a estafada e esvaziada designação de entrada gourmet.
O seu sucesso deve-se ao facto de ter sido, e ser, o exemplo acabado de como um prato de extrema simplicidade, quer nos sabores quer na confecção, pode ser muito bom ou muito mau em função da qualidade dos ingredientes (camarão de origem nobre, cozido com casca, alface fresca, bom molho) e do seu modo de apresentação.
O camarão ideal é o médio, que possa ser comido numa só dentada, o corte da alface (de preferência Little Gem, com talos semiduros que resistem ao dente) é fino, mas não demasiado fino. Quanto ao molho, claro, não deve ser industrial, é aqui que está o segredo. Nada despiciendo é o recipiente onde se alberga, uma taça de pé alto e vidro fino com tamanho suficiente para a quantidade ideal: cinco camarões médios e duas boas colheradas de alface, nem mais nem menos. Nesta jornada de regresso aos anos 60/70 vi-me compelida a refazer o cocktail de camarão, antevendo já a minha desilusão. Ilusão. A sua comovente simplicidade e escassez de sabores e ingredientes é refrescante numa época em que tudo o que pomos à boca tem que ser um desafio e uma experiência. Aqui vos deixo a minha receita e o link para a do Heston Blummenthal, para quem este é o prato favorito.


A minha receita
Para o molho
2 colheres de sopa cheias até ao topo de maionese de óleo vegetal (pode acrescentar-se algum azeite)
1/2 colher de sopa de um bom ketchup
gotas de Tabasco
1 colher de chá de sumo de limão
Como opção, umas gotas de cognac
Mistura-se tudo e rectifica-se até obter o sabor e a cor desejada.

10 camarões médios
2 alfaces Little Gem ou outra
O Molho do Heston Blummenthal (At Home with Heston Blummenthal, Bloomsbury, ver aqui) não leva Tabasco, substituído pelo conjunto pimenta-de-caiena- molho Worcesteshire.


Experimentem olhar de novo o cocktail de camarão com uma mirada revisionista. Nem tudo o que ficou para trás é mau. Pelo contrário. Para a próxima fala-vos de pratos, de travessas e do serviço de guéridon, aquele carrinho que vinha várias vezes à mesa com aperitivos, carnes, e com preparados flamejantes e mágicos como os Suzette. Ficam para a próxima crónica. 



Maria De Fátima Moura
“Fatima Moura has a college degree in Philosophy and culinary degree in Escola
 
de Hotelaria e Turismo do Estoril. She published several books in the area of gastronomy
and was distinguished
internationally. In Portugal: The best fish in the world, The big book of Chefs (2008) and
Cataplana Experience (2009), Fatima Moura reunites recipes from the most well
known and successful chefs working in Portugal, and some abroad, with history
notes and advices on how to cook. The author and culinary was, in 2010
distinguished by the International
Academy of gastronomy, having won the "Prix de la Littérature
Gastronomique" with the book Cataplana Experience." In 2013,
Portugal, The Best Fish in the World was third in its category of the Goumand
Awards.  She writes a blog, Conversas à Mesa. 
 



Hooray to simplicity: shrimp cocktail


Tiago-"I am the living proof of the shrimp
cocktail's resilience: when I was fifteen and started to work in the trade,
shrimp cocktail was the first dish I made in Hotel Solverde, a five star. "
 
Food is also a fashion victim. Nowadays, we have several examples of food fads, some of them we keep, some of them we throw away happily.  For instance, recently we had the egg at 62ºC, which seems to be fading away, thank God, the abuse of flowers in the palte and the omnipresent rucula.
There are some dishes that have been loved, cherished and served nonstop for a decade or even more, only to fall in total oblivion, while others remained very much alive or were ressurected in vintage versions. The ones that survived are generally the simplest in taste.
In the Sixties, one of my food passions as an adolescent was one those iconic dishes recently recovered: the shrimp cocktail that I loved almost as strongly as Crêpes
Suzette. It used to be important all over Europe, though its origin lies in the USA, more precisely in Las Vegas, where irt was made with a very reddish and piquant sauce. They say that the habit of serving it in a tall glass comes from the Prohibition times, to emmulate an alcoholic cocktail.


In Lisbon, it was served in fine dining restaurants (Gambrinus still serves it), but mostly in hotels, such as the Ritz or the Palácio from Estoril. In the old Avis, Mestre João Ribeiro, the cook, created a similar cocktail, substituting clams for the shrimp.  This appetizer was so simple, that every cook tended to introduce its own alterations, mainly in the sauce department.
How is it possible that a bed of julienned lettuce with a handful of shrimps and Marie Rose sauce could have delighted sophisticated people a while ago?
And how is it possible that we are currently experiencing a revival of this dish? Symbol of a refined appetizer at the bourgeoisie table, it had enough charisma to permeate the whole meal of a happiness aura. To go with it, people drank a gin tonic, a dry martini (“stirred not shaken”) or a white wine. Today it would receive the overused and meaningless designation of gourmet.
Its success derives from being the utmost example of how a very simple dish, in its ingredients and in taste, can be very good or awful, depending of the quality of its ingredients (good origins shrimp, perfectly cooked in its shell, fresh lettuce, homemade sauce) and of its presentation.
The medium shrimp, bite size, is ideal for this cocktail; the cut of the lettuce julienne (the best is Little Gem, slightly crispy) is thin, but not too thin. The sauce should not be the kind you buy in a jar, because it is in it that lies most of the secret. Important is also the recipient where it is served, a long stemmed glass, which can harbour five medium size shrimps and two spoonfuls of lettuce, no more no less.
In this revival trip to the 60s/70s I was compelled to prepare the shrimp cocktail myself, anticipating a big delusion. Illusion. Its touching simplicity and linearity of tastes and ingredients is refreshing in an era where everything that you eat has to be challenging and enticing. Here goes my personal recipe and the link to Heston Blummenthal’s favourit dish.


My recipe for 2
Sauce
2 full tablespoons vegetable oil mayonnaise (sometimes I add some olive oil)
½ tablespoon of a good tomato ketchup
some drops of Tabasco
1 teaspoon lemon juice
As an option, some cognac drops

Mix all the ingredients and, if necessary, rectify for taste and colour.

10 medium size shrimps, cooked to perfection
2 Little Gem lettuces, julienned


Heston Blumenthal’s sauce (At Home with Heston Blumenthal, Bloomsbury, (see here) doesn’t have Tabasco, replaced by cayenne pepper and Worcestershire sauce. 



Try a fresh look at the shrimp cocktail. Not everything behind in time is bad. And how about a revival of the guéridon service and of the flambés, as magic as the crêpes Suzette? Next time.





Crónica de: Maria De Fátima Moura
Facebook: https://www.facebook.com/conversasamesa
Blog:Conversas à mesa                                                             

Leitores